domingo, 30 de outubro de 2016

Outubro Rosa e eu.

Publicado no Diário do Amapá em 25.10.16

Outubro chegando ao fim cumprindo a sua tarefa. É Outono no Hemisfério Norte. As árvores se despem das folhas verdes vestidas pela Primavera e embelezadas com o brilho do sol do Verão, dando lugar a tons amarelos matizados com vermelho ou marrom num espetáculo sem igual. Em suas máquinas, os agricultores aqui no Norte já colheram as batatas, as beterrabas, o trigo, o milho, as ervilhas, o linho... Trabalham de sol a sol na corrida contra o tempo ajudando-se em mutirões na colheita. O proprietário é seu próprio patrão.
É a hora de preparar o terreno para o próximo ano. As mulheres se ocupam do jardim, do pomar e da horta, o que aqui é uma tradição. Muitas são professoras, funcionárias públicas ativas e aposentadas.
A vida continua. A faina agrícola segue seu curso. O que muda de ano para ano é a rotação de culturas que possibilita diminuir a exaustão do solo.  A vida continua para mim também e, cada vez que lembro disso, agradeço a Deus por me permitir fazer parte de toda a beleza que ela representa. Cada vez que o Outubro Rosa passar pela minha vida, lembrarei que fiz parte dessa imensa população atingida pelo câncer. A monoterapia com Avastin (Bevacizumab) ainda não havia terminado e teve que ser suspensa. Minha pressão arterial não suportava mais seus efeitos. Foram 14 meses de tratamento ao todo, incluindo cinco sessões de quimioterapia. “A Senhora agora é uma pessoa normal. A Senhora está boa”. A confirmação da médica só fez efeito em mim quando atravessei o hospital Leonard da Vinci saindo daquela última consulta com a oncologista no início do mês. Olhando as pessoas que aguardavam o tratamento ou uma consulta de controle eu continha as lágrimas que insistiam em escorrer pelo rosto ao imaginar como estaria cada uma delas. Se teriam a mesma chance que eu estou tendo. E até, se essa doença voltaria um dia e eu tornaria a me sentar naquela sala de espera aguardando a enfermeira vir chamar para o tratamento. Não caí em depressão na pós-cirurgia como receavam minhas amigas francesas. Assim que pude, voltei ao esporte. Mas nessa última visita médica naquela manhã, a minha ficha caiu. O fantasma do câncer estará sempre me lembrando dessa fase da minha vida. Naquela manhã, dirigi o carro de volta para casa em lágrimas pois, só aí me dei conta do perigo que passei e que vencemos! Sim, vencemos. Porque esta vitória representa a dedicação de várias pessoas: do meu marido, que sofreu mais do que eu; da equipe médica que me operou ano passado, da oncologista que me acompanhou durante o tratamento inteiro, profissional muito responsável que só sai do hospital no final da tarde, depois que atender o último paciente.
Outubro Rosa. Seja bem-vindo sempre! A campanha de conscientização e prevenção do câncer deve estender-se também à parte que a mulher tem de mais íntimo e que lhe proporciona ser mãe: os ovários.
O câncer atinge a população do mundo inteiro. E o que comemos influencia muito. O Brasil precisa adotar uma política mais séria de prevenção e de tratamento da doença em relação aos recursos que possibilitem a todos, sem exceção, serem tratados. Não se deve admitir a falta de medicamentos ou a exclusão de pessoas. O tratamento contra o câncer deve ser acessível a todos. Os protocolos devem ser seguidos à risca para obter-se bons resultados. Para o doente, é vital a certeza que o remédio esteja disponível no hospital e que a periodicidade de seu tratamento seja respeitada. O estresse da incerteza também mata. Aqui, pagamos um plano de saúde que não é caro. Todas as consultas, remédios, injeções, exames, etc., no que dizem respeito a esse tratamento, estão cobertos pelo plano.

Outubro Rosa sai deixando a porta aberta para Novembro Azul que está chegando. Mas fica o alerta: não esperem por uma campanha nacional. Cuidem-se sempre! 

Infância ultrajada.

Publicado no Diário do Amapá em 19.10.16

Grosseria irônica do descaso: Na semana em que se festejava o Dia da Criança e o Dia do Professor, a reportagem do Jornal do Amapá do dia 14 de outubro último noticiou o “estupro de uma criança de 9 anos dentro de uma escola estadual por um condenado da justiça, que cumpria pena alternativa na escola”. O que certamente chocou os amapaenses.  Não bastasse o governo, ordenador de despesas, suspender os contratos de vigilância com os terceirizados deixando à margem da economia muitos pais de família e, em consequência, desprotegendo as escolas, professores e alunos, agora temos essa ameaça com passe livre nas nossas escolas.
Cabe aos órgãos competentes investigar a autoria do fato alegado bem como a responsabilidade de quem possibilitou ao condenado cumprir pena dentro de uma escola, e, se realmente, o autor era um apenado cumprindo pena.
O certo é que não podemos ficar com a boca aberta tentando engolir o susto, nem limitar nossa indignação com tantos fatos violentos que vem acontecendo em nossa terra aos comentários em família e entre amigos. Não podemos ficar omissos quando sabemos que, além de todos os problemas causados pela falta de segurança de nossas escolas que estão sendo depredadas e saqueadas e seus professores agredidos por vagabundos, nossas crianças não podem nem ir ao sanitário sozinhas porque o bandido, de tocaia, ataca para roubar a sua inocência da forma mais vil e desumana! Em que ambiente estamos criando nossos filhos??
O Estado é o ente responsável pela segurança de nossa população mas aí, caríssimos, o Amapá está deixando a desejar. E muito! E não é falta da polícia, não. A polícia não é composta só do efetivo humano. Precisa de toda uma estrutura material e apoio moral para ser eficiente, além de valorização profissional. Policiais são seres humanos que arriscam a própria vida para proteger outros seres humanos. Escola é lugar de crianças, de jovens, de mestres, de livros e não de bandidos! Escola é lugar de alegria e não de tristeza; escola é lugar de formação de pessoas, futuros adultos; lugar de aprendizagem. É às escolas que confiamos nossos filhos e netos! Se não pudermos mais confiar nas escolas na certeza que lá nossas crianças estarão seguras, o que será de nós?? O que será de nosso estado, de nosso país?? O que será de nosso povo, de nosso futuro??
Acorda, Amapá! Tuas ruas estão tomadas pela bandidagem! E isso é consequência do desemprego; da falta de investimento e acompanhamento da infância que, hoje, se tornou bandida; da falta de segurança e da aplicação efetiva das leis. E também, da falta de respeito às leis. E tudo isso tem como base a negligência para com a Educação! Sem falar na corrupção e nos comportamentos ilícitos de quem só quer um cargo político para se beneficiar!
A questão agora é: quem vai reparar o erro que deu causa ao crime contra essa inocente? Ou ao menino que também foi violentado em uma escola meses antes, ainda segundo a reportagem. Ninguém pode reparar! O prejuízo está feito. Irreparável! Corpo e mente destruídos. A inocência e a segurança de nossas crianças não estão sendo levadas em consideração. Onde chegaremos com esse estado de coisas? Assaltos todos os dias! Bandidos armados em cada esquina esperando dar o bote. Comerciantes, clientes e população assustados. Estamos ultrapassados pela violência!

Amapá, o pote de ouro de certos políticos virou um bacio cheio de fezes para seus habitantes! Infelizmente! Desculpem a expressão. Amo a minha terra e seu povo, pois faço parte deles. Mas estou me sentindo envergonhada perante os pais dessa criança e de tantas outras que sofrem por falta de uma política direcionada para a proteção infantil pois, proteger as escolas é também proteger seus usuários e funcionários. 

A cidade e o país dos meus sonhos.

Publicado no Diário do Amapá em 27.07.16

Convido o caro leitor a dividir um sonho comigo. Mas advirto que qualquer semelhança com a realidade brasileira é mera coincidência. Então, feche os olhos porque isto aqui é um sonho, como eu já disse.
Estamos passeando pelo nosso país, nosso estado e nossa cidade. Estamos sonhando que passamos por ruas limpas, com faixas para pedestres, com ciclovias e rotatórias. Aqui neste sonho os eleitos Presidentes da República, prefeitos, governadores, senadores, deputados e vereadores só têm intenções voltadas para o bem-estar da população. Não fazem o que bem entendem com os recursos públicos nem pedem propinas dos empresários. E nem tentam subornar funcionários públicos. O povo não é obrigado a votar mas, quando vota, vota consciente.
O nosso sonho é tão real que acabamos por acreditar que as praças são limpas e seguras e que podemos brincar com nossas crianças no parquinho sem receio de sermos assaltados, ou coisa pior. Constatamos que ninguém se apodera das flores de seus canteiros nem agride os bancos e brinquedos colocados à disposição da população.
Neste sonho que estamos dividindo, as pessoas se cumprimentam e se respeitam. Não se encaram nos olhos a não ser que estejam conversando. E não estão nem aí se você se veste de roxo ou se você é religioso ou ateu porque, na verdade, o que importa é que todos cumpram o seu papel na sociedade livre.
 Na cidade dos nossos sonhos os idosos são respeitados e têm vida longa. O profissional da saúde vai até ele se o idoso não puder ir ao hospital. Eita sonho lindo! Não tem crianças nas ruas em situação de risco trabalhando ou esmolando. Criança vai à escola em tempo integral. É a melhor fase para a aprendizagem e as crianças estão abertas a tudo.
Os motoristas diminuem a velocidade de seus veículos pelo fato de ser horário de saída das crianças da escola. É raro o motorista que passa a mais de 30 km/hora em frente a uma escola. Além de ser velocidade máxima imposta por lei, criança é respeitada.
As ruas estão sempre em bom estado de conservação, os redutores de velocidade são lombadas, são canteiros dividindo e estreitando as mãos de direção para evitar a ultrapassagem forçada. Tudo para evitar acidentes. E os motoristas não reclamam de lombadas, nem de radares. Nas confluências das ruas e rodovias as rotatórias são perfeitas.
Os serviços públicos funcionam. Não podemos dizer que a cidade dos nossos sonhos seja perfeita, mas, nela, a corrupção não mata. Os hospitais são, na maioria, particulares e os médicos, enfermeiros, etc, têm dedicação exclusiva porque assim é a lei e os salários são bons. Os planos de saúde são aceitos em todos os hospitais da rede particular. Todo cidadão é aceito, mesmo aquele que não tem plano de saúde.

Pagar empregada com dinheiro público nem pensar! Quem não pode pagar os custos de uma empregada doméstica mas contrata uma faxineira para trabalhar 3 horas por semana, é considerado de padrão social médio. Na cidade dos meus sonhos, ou melhor, dos nossos sonhos o salário mínimo permite que uma empregada doméstica tenha um carrinho modesto. Maracutaias entre políticos ou alguns funcionários existem, mas em nível ínfimo. Afinal, não existe perfeição. Mas nem por isso justifica-se.

O espetáculo da vida no rio (escrito antes do fechamento das duas mais recentes barragens no Rio Araguari).

Republicado  no Diário do Amapá em 29.07.16

Sete horas desta manhã de janeiro chuvoso. 25° na beira do rio. No Norte do Brasil, onde a temperatura atinge acima de 30°, uma baixa de 5° faz muita gente tirar a roupa mais quente do armário. Tudo tranqüilo na cabeça da ponte. As touças de mururé descem o rio com a vazante para voltarem depois, com a enchente.
O bando de mergulhões se aproxima rápido com uma coreografia natural peculiar seguindo seu líder. A maneira como freiam com os pés, repentinamente, desde que localizam um cardume provoca admiração ao espectador. Alimentados e molhados, param adiante sobre os frechais de cercas ou sobre as cabeças de tarugos permanecendo com as asas abertas até o próximo voo.
O boto atrai a atenção com sua magia e beleza fazendo os mergulhos habituais de pesca. É o terror do pescador porque fura as malhadeiras para atacar os peixes indefesos deixando buracos enormes causando duplo prejuízo: um, porque come o alimento que o pescador deveria levar para casa, outro, porque danifica o seu instrumento de sustento.
Para as virgens dos vários recantos escondidos da Amazônia, o boto ainda é a desculpa utilizada quando dão com os burros n`água ou, quando desgraçadas pela animália existente em algum próximo, até mesmo da própria família, a barriga começa a crescer. Segundo a lenda, o boto se transforma naquele belo homem de olhos azuis vestido de branco e de chapéu na cabeça, que entra nas casas como quem não quer nada, vindo não se sabe de onde mas que, na verdade, vem namorar e acaba engravidando as moças das redondezas. Diz ainda que, quando o estranho vai embora deixa um cheiro de pitiú no ambiente e desaparece no ar, ou melhor, na água, sem ser identificado. Só então desconfiam que aquele belo homem era um boto. Aí, é um Deus nos acuda...A boa Maria, que vem de Macapá mas que nasceu e embarrigou a primeira vez na Ilha de Caviana, quando dorme na fazenda fecha todas as venezianas e coloca dentes de alho no sutiã, com medo do boto. Para que a noite se alongue, basta pedir-lhe que conte uma história de boto. Ela solta a língua e repete as lendas de sua terra natal. Entre elas, a história de que uma “buta” deitou-se na rede com o irmão dela e quase o encantou. Os rapazes adoram atiçar a Maria e, no final, todos acabam rindo.
Durante o dia, a maré sobe trazendo consigo os restos de um animal morto que os urubus tentam devorar por cima. As piranhas já se encarregaram da parte submersa.
Os mururés continuam na sua labuta diária de subir e descer o rio, no embalo da correnteza, sem remar e sem precisar de outro meio de transporte para se locomover a não ser a própria água. No entanto, sabe-se lá que espécies de criaturas levam consigo! Quase se escuta a música silenciosa composta por suas pesadas raízes no atrito das profundezas das águas...
O silêncio só é cortado pela canoa que, ao bater na madeira da lancha faz um barulho baixo e ritmado e por um grupo de tetéuas barulhentas que bailam por cima da ponte. Verdadeiro espetáculo. Sem necessidade de ir à Ópera de Paris, de Lyon ou de Douai. Aqui, tem de tudo. O italiano Verdi comporia maravilhas com toda esta riqueza.
No fim da tarde, depois de voltar da roça com os últimos jerimuns e maxixes o empregado remplaçant (substituto) entra com uma enfiada de acaris e apaiaris pescados ao lado da casa numa rara e agradável surpresa. Depois, vai tomar seu banho no rio e repete o cerimonial habitual para seu passeio noturno na fazenda vizinha distante dois quilômetros de nossa casa, ou encontrar uma paquera que não pretende botar a culpa da barriga no boto. Vai fazer concorrência aos mururés, num descer e subir do rio...remando.
A noite chega depois de um dia chuvoso. Do outro lado do rio, os guaribas gritam chamando as fêmeas. Preparam-se para o encontro. A água continua a descer num vai-e-vem interminável.
Os mururés se despedem de nossas vistas para se agarrar ao primeiro porto que encontram pelo caminho. Quisera eu poder escorregar como eles sobre as águas!


(Em 2015, depois do fechamento das barragens, as águas de inverno do baixo Araguari já não subiam nos campos como outrora. Em abril deste ano de 2016, quando deveriam estar a meio metro de altura nos pés da palafita residencial, mal chegavam no meio da ponte da frente da casa. Para melhor compreensão a ponte em frente à casa tem trinta metros de comprimento e a profundidade do rio na cabeça da ponte é de seis metros. As águas do rio estão recuando na direção de seu talvegue próximo a cabeça da ponte em novembro, o que só acontecia em janeiro. A foz do Rio Araguari fechou sim, mas a causa principal foi a construção dessas duas últimas barragens que impedem a vasão das águas que expulsavam os sedimentos na sua foz fazendo o rio correr mais forte para a vala que vai até o Rio Gurijuba).

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Quem tem rabo de palha não passa perto de fogueira.

Publicado no Diário do Amapa em 23.06.16

Atualmente no Brasil há uma grande fogueira acesa queimando na horizontal e na vertical. E o motivo não é a quadra junina. O fogueiraço em evidência queima a mente cheia de má fé dos envolvidos em diálogos nada santos. É pior que as fogueiras da Inquisição que, por sua vez, também não foram santas. Nem santa foi a Inquisição. Nada que faça imaginar atualmente a existência dos considerados hereges ou bruxinhas de nariz grande que voam montadas em uma vassoura e que povoam a mente das crianças nos contos de fadas (aquelas que ainda acreditam em fadas, duendes e bruxas de acordo com a fantasia recebida da família, contos de ninar, etc). Se bem que, infelizmente, muitas de nossas crianças cedo conhecem o lado grotesco, repleto de bruxas más da vida, a maioria por omissão de quem deveria agir para amparar e proteger a infância, o ente maior: o Estado. Não com bolsas paternalistas que fomentam o comodismo/desemprego e incham o orçamento do estado mas, dando oportunidade de trabalho e salário dignos aos pais para manterem sua prole na escola.  Se estivéssemos na Idade Média, as personalidades envolvidas atualmente em todas essas operações da Polícia Federal, com certeza seriam condenadas à fogueira tamanho são os crimes contra a nação e o povo brasileiro dos quais estão sendo suspeitos. Têm sorte por viverem neste século pois, apesar de não respeitarem a Constituição Federal, estão amparados por um de seus Princípios mais sagrados, o Princípio da Ampla Defesa... Os personagens deste fogueiraço (políticos, executivos e técnicos atualmente envolvidos em grossas maracutaias, mais parecidos com bruxas do que com fadas), não voam em vassouras nem em tapetes voadores. Voam em jatos particulares ou à custa de algum empresário em troca de favores pagos com o nosso dinheiro. O meu, o seu, o dinheiro dos impostos que pagamos! Não dá para desacreditar que aquelas conversinhas foram tão inocentes assim. Dá? Agora, cá pra nós, a maneira como foram conseguidas é que foi de uma nojenta má fé, não foi? Apesar de que, quem gravou estava se preparando para defender o dele que estava na reta! Dá para medir força entre um tubarão e uma baleia? Será que as ditas conversas foram imaginadas “inegraváveis ou “inescutáveis” ou até mesmo porque os personagens se julgavam inatingíveis? Ou imexíveis (lembrei do ex-ministro Magri). E vazaram!
Não apenas Brasília mas o Brasil inteiro ferve com delações e gravações. As redes sociais, o Youtube, etc, estão cheios de informação.  Quanto mais se mexe na lixeira, mais sai lixo. E o povo brasileiro exige mudança nas leis, mudança na política e, principalmente, no tipo de político. Não acreditamos mais! O sistema é todo corrompido até no nível estadual! Por falar nisso, o que aconteceu com aquelas Operações da Polícia Federal aqui no Amapá? Como cidadãos, temos o direito de saber.
“A lava jato é uma intervenção no crime organizado”, Joao Guerreiro da Redebrasil.net resume, em poucas palavras, que o país está em intervenção. Como acreditar nos políticos que temos se os implicados são mais de 140! É a quadrilha do Ali- Babá e mais 100! Quantos políticos não se envolveram com a lama que sai todo dia desse esgoto?
Por esse e outros motivos, qualquer cidadão inteligente que priorize o país e a população, entenderá que defender eleições agora seria um grande risco para o país.

Quanto ao Eduardo Cunha, “um dos 60 homens mais poderosos do país”, imagine o caro leitor se ele resolver fazer delação premiada? Ou se a sua mulher e sua filha seguirem o exemplo de Nicéia, ex-mulher de Celso Pitta, que denunciou o esquema de corrupção em que o marido estava envolvido em São Paulo? Ufa! O fogueiraço vai se transformar em uma bomba atômica! 


quinta-feira, 16 de junho de 2016

O jet lag do Douglas.

Publicado no Diário do Amapá em 01.06.16

Agora que você voltou de sua viagem espacial e se recuperou do jet lag, Douglas Lima, espero que esteja com a saúde em paz com o universo, amigo. Se você tivesse aterrissado em Brasília veria que os escândalos mais recentes atingem pessoas que estiveram bem pertinho de nós aí no Amapá. Mas você escolheu aterrissar na terrinha Tucuju onde os escândalos não são diferentes. Não só você mas, eu também, e uma boa parcela de amapaenses que esperam e querem o melhor para os estudantes de nossa cidade, fomos pegos de surpresa bem no cerne do tema de meu último artigo sobre a Educação. Lá onde eu discorri acerca do nascimento de Ayumi, minha sobrinha neta. Você lembra? Confesso-lhe que, com tanta roupa suja sendo lavada na política nacional colocando em questão a seriedade de nosso país ferindo de morte a nossa economia, empurrando nossa juventude cada vez mais fundo no abismo, tirando a esperança dos pais de família de verem sua prole crescer sadia e constituir por sua vez sua própria família,  eu também, mesmo estando longe daí fisicamente (porque deixei minha alma e meu coração às margens do Rio Amazonas) eu também, repito, sinto-me tentada a me associar, quem sabe aos chineses e pegar uma nave espacial para ir bem alto apreciar tudo isso de longe, lá do infinito. Porém, o sentimento e o zelo pelo meu país não me permitiriam jamais virar as costas para os acontecimentos atuais. É assim que, com outro artigo pronto para te enviar, li, reli, rabisquei, mudei várias frases, até que estou desistindo de enviá-lo porque já me parece obsoleto face às novidades que se apresentam a cada momento na nossa suja política nacional. Naquele rabisco de artigo não enviado eu abordava a esperança que nosso povo deposita na faxina política e na melhoria da situação geral brasileira; eu conversava cá com meus botões sobre uma provável operação da PF na questão do milhão federal e dos uniformes mas, torcia para que o fato se esclarecesse e um ou outro aparecesse (esperança minha); eu divagava também sobre a hora e a necessidade de se fazerem novas eleições presidenciais, o que, no meu entender não seria o  momento certo, pois quem elegeríamos? Lula mais uma vez, que coligaria com Marina? Ou Marina, que coligaria com Lula? Ou seria com quem? E eu continuava: “o Brasil carece de opções. Quem poderia nos apontar algumas? O Brasil precisa de mudanças imediatas. Precisa atrair de volta os investidores. Não temos tempo, nem dinheiro, nem candidatos para investir em uma nova eleição agora. Que tal darmos um tempo para o país respirar e tentar levantar a economia e lavar a alma perante a comunidade nacional e a internacional? O que queremos é um país conduzido por pessoas decentes que respeitem o cidadão brasileiro. Assim, a saúde, a segurança, a Educação e tudo o mais, funcionarão melhor. Este blábláblá é repetitivo? É . Mas o prejuízo também é. E o poço está cada vez mais profundo”. Isto seria parte do artigo que não lhe enviei. Transformei-o em uma metalinguagem? Não importa.
Porém, com razão o Senador Cristóvão Buarque disse “a situação que enfrentamos é culpa de todos”. Ele pronunciou esta frase no Senado onde muitos bem mereceram escutá-la e muitos de nós aqui de fora, também. Uma frase a ser analisada.

Não, não farei uma viagem espacial, Douglas. Não irei para outra galáxia porque quero ver o resultado disso tudo aqui neste Planeta! Mas de bom grado eu colocaria numa nave espacial, sem retorno, os salvadores da pátria pré-candidatos ao cargo de prefeito que já começam a ricochetear discursos na mídia “representamos a mudança e a esperança de um povo que está cansado de sofrer” blábláblá. Ai! Poupem-nos, senhores! Discursos vazios que já caíram de moda. Ou será que alguém ainda acredita nisso? Se continuarmos a acreditar em salvadores da pátria não sairemos da mesmice. E é o que menos precisamos. Ou nunca mais nos recuperaremos do jet lag causado pela hipocrisia política.


Temos sido muito gentis.

Publicado no Diário do Amapá em 10.05.16

Temos sido muito gentis e, a maioria das vezes, coniventes. A complacência usada por longo prazo gera a indolência e, infelizmente, é apreendida como senso comum. Para dar um exemplo: a corrupção, que entrou no conceito de muitos como sendo uma coisa normal; o ganho fácil e o lucro exacerbado. A situação que vivenciamos no Estado do Amapá e em vários outros estados (salários parcelados, reivindicações de pagamentos de terceirizados, etc, saúde, segurança, educação sucateadas, violência aumentando demonstram que, há muito tempo, os gestores perderam o controle administrativo e financeiro daquilo que evitaria que chegássemos a esse caos. Não cabe mais justificar a crise amapaense como se fosse exclusivamente uma consequência da crise nacional, do rombo da Petrobrás e de outros rombos, porém, a má administração da coisa pública brasileira e amapaense gerou os dias atuais. Para externar a minha opinião, minha e somente minha, fruto do meu exercício de memória e de raciocínio, fruto da minha cidadania, digo que fico cada vez mais pasma ao ver e escutar na mídia as propagandas das obras que estão em andamento em alguns municípios do Estado. Pergunto: Não está faltando dinheiro para se investir nos setores essenciais? Se tem recurso financeiro sobrando para propagandas das obras dos gestores por que não se tomam providências legais para que esse recurso possa ser transferido para os serviços que interessam realmente ao cidadão amapaense? Será que a razão está na mentalidade dos gestores que imaginam que o povo ainda é aquele povo que não questiona, não vê e não tem inteligência? O povo da política do pão e circo? Imagino que algum conselheiro político ou de qualquer outra coisa, diga ao gestor: vamos lançar uma propaganda para lembrar ao povo as obras que Vossa Excelência está construindo e assim, acalmar os ânimos e as críticas negativas. E, pá! Lá vem aquelas palhaçadas adentrando a minha, a sua residência, caríssimo amapaense. E a impressão que me causa vendo a cara de pau da pessoa vomitando essa propaganda de obras realizadas é que, no seu entender eu sou uma idiota, uma pateta alienada que vive nas nuvens e de novelas (coisa que detesto) e que eu vou esquecer que no Amapá tem o Aedes Aegypti que, quando não mata, aleija; que no Amapá a maioria da população não foi vacinada contra a H1N1, que no Amapá reinam a paz e a segurança gerais. O caos que nos abate nos últimos meses com o impedimento de quase todos os pretensos substitutos, fazem crer que nenhum dos candidatos à substituição da presidente parece estar isento, até processo transitado em julgado, muitos dos quais nem iniciaram. Haja circo e lixeira para suportar tanta sujeira moral! O brasileiro sério que não está atolado nessa imundície deve, realmente, ter estômago de aço para aguentar tudo isso... Precisamos nos indignar mais. Precisamos ser menos complacentes. Com inteligência.


Nasceu Ayumi.

Publicado no Diário do Amapá em 04.05.16

Nasceu Ayumi, minha primeira sobrinha-neta. Ayumi nasceu bem, porém, após os primeiros afagos paternais inspirou cuidados médicos por haver ficado “roxinha” segundo a mãe me relatou quando fui visitá-la com minhas boas-vindas. Mais uma criança veio ao mundo, mais uma menina, mais uma mulher. Felizmente Ayumi nasceu em um país ocidental, um país cristão. Quem conhece a situação da mulher na Índia ou no Paquistão, onde a mulher é odiada, ou em países africanos que praticam a excisão do clitóris nas meninas (mutilação genital) compreende porque Ayumi é uma felizarda (e eu também) por havermos nascido em um país cristão. Bom, aqui teríamos assunto para milhares de artigos.
Ayumi nasceu em pleno efervescer do processo de Impedimento da Presidente da República do Brasil, no vigor da Operação Lava Jato, da Operação Acarajé e tantas outras dignas de nossos políticos e comparsas, a maioria corruptos. Sem esquecer da interminável, inquestionada e adormecida Operação Mãos Limpas que, depois de todo o esforço e o brio do aparato policial, dorme em algum canto esperando pelo príncipe encantado que venha despertá-la com um beijo.
Ayumi chegou e já deu aquele sorriso dos inocentes que os músculos faciais de um recém-nascido provocam. Chegou sem saber que é bem-vinda e querida porque de nada se dá conta ainda. Ayumi  é recebida neste contexto geográfico amazônico sempre promissor e muito cobiçado por países que destruíram seus recursos naturais. Mas Ayumi chegou também em um contexto moral, ético e político avassaladores. Isto é a mistura de boas-vindas que nossa sociedade preparou para ela e para tantos bebês que nascem todos os dias. Seus pais já fazem planos para seu presente e seu futuro. Entre os planos futuros está o de frequentar a escola, com certeza. Mas nem por isto conhecem o problema da Educação em nosso país, em nosso Estado. Um problema que, parece, não ter solução por falta de interesse dos capitães mores em resolver as dificuldades pelas quais passa o ensino público. Seus filhos podem estudar sem essas dificuldades porque frequentam escolas particulares mas Ayumi e tantos outros bebês têm pais que não podem pagar uma escola particular e, sequer, têm dinheiro que justifique a compra de uma carteira porta-cédulas. Somo minha indignação à indignação de Douglas Lima presente na edição do Diário do Amapá de 28.04.2016 : “...  Mas uma educação capenga parece existir só aqui. É só olhar pro Bailique, onde até agora, pasmem, as aulas de 2016 ainda não começaram. O por quê? Falta de professores. Incrível! Educação é um direito garantido na Constituição Federal. Mas em se tratando disso o Amapá parece não ser Brasil”.
Para completar e reforçar as indignações faço das letras de Douglas as minhas: “Terra que não evolui. O Amapá era pra ser um estado modelo do Brasil, quiçá da América Latina ou mesmo do mundo... Sabe por que falo isso? Porque desde que cheguei aqui, no início dos anos 1990, ouço e divulgo como jornalista as carradas de dinheiro que chegam aqui. É grana proveniente de emendas parlamentares, recursos federais, empréstimos bancários para as mais mirabolantes obras, receitas próprias do estado e do município. Dinheiro pra cá, dinheiro pra lá. Em suma, uma grana grossa. Mas nada ou quase nada é feito...”

É, Douglas, como podemos imaginar para nossas crianças uma educação digna com escolas dignas se no Amapá e seus Municípios não está havendo o investimento necessário para tal? Como posso acreditar que a Ayume e os bebês que nascem todos os dias terão escolas com a garantia de professores, bibliotecas, merenda escolar, segurança, etc, se a Ayume não é filha de vereador, deputado, prefeito ou governador, nem seu doutor, para que seus pais possam pagar escolas particulares, o que por si só, é um desvio de finalidade do Estado e um crime contra a educação básica pois a escola gratuita é uma garantia da Constituição a toda criança, a todo jovem, a todo filho do pai ou da mãe, seja rico ou pobre. Se o Amapá parece não ser Brasil, com todo esse desprezo pelo povo e pela melhoria da vida do cidadão, apesar de toda a grana que veio para cá, eu repito o que ouvi um dia de um ribeirinho: aqui deve ter sido enterrada uma cabeça de boi bem chifruda para emperrar o progresso, você não acha?


Ser brasileiro.

Publicado no Diário do Amapá em 30.04.16

Para se compreender a alma do brasileiro
Há que se despir de todo preconceito e se empanturrar de paixão.
Há que se embriagar da natureza do brasileiro e esquecer toda forma científica que define um povo.
Ser brasileiro não é ser pobre ou rico, nem branco, negro ou amarelo
Não é ser indígena, europeu, asiático, africano ou oceânico.
Ser brasileiro é ser tudo isto misturado em um só sentimento,
Embora em várias maneiras de ser e vários pensamentos.
Por isso, ó prezado estrangeiro, não diga que você conhece o povo brasileiro
Se você não sabe o que é o apego e o amor à Pátria amada,
Se você quer exigir a objetividade e a imparcialidade nas emoções de um brasileiro;
Se você não sabe reconhecer o orgulho desse povo por seu país, ainda que a pátria mãe tenha dado seio e abrigo a um monte de corruptos e outro monte de arrogantes que envergonham a nação, não julgue o sentimento do povo brasileiro.
Não diga que você conhece o povo brasileiro se você não sente seu estômago revirar de náuseas e tristeza com a desordem que atinge este país por culpa de outros maus brasileiros.
Ser brasileiro é saber surpreender com a criatividade; é saber improvisar do nada quando as fórmulas pré-concebidas lhe escapam;
É saber inventar o dia-a-dia sem parâmetros estudados, sem agendas pré rabiscadas; é saber ser íntimo ao ponto de se auto convidar para um café ou uma cerveja na casa de um amigo na certeza que, em vez dele responder: “não dá, tenho um encontro com outro amigo”, ele dirá: “venha, ficaremos todos juntos”. Mesmo que seu amigo saiba que você é um cara de pau ele te acolherá por conta do sentimento de amizade. Porque na casa, na mesa e no coração de um brasileiro sempre cabe mais um; porque na panela de feijão tem lugar para acrescentar-se um pouco de água. Mesmo que o tamanho da panela seja o limite necessário para se evitar o abuso.
Ser brasileiro é se deixar transportar para onde o vento soprar sem medo do desconhecido porque você sabe “se virar”, é saber mudar quando a situação o exige, é fazer das tripas coração em épocas de crise;
É saber separar o joio do trigo e expurgar as ameaças à Democracia, é saber banir a hipocrisia e afastar os interesses pessoais maiores que os interesses da Nação Brasileira;
É saber imitar Fênix e renascer das próprias cinzas quando todos acreditam em sua falência!
É saber exigir seriedade no comportamento e nas escolhas políticas no momento-limite mesmo sendo um povo levado pelo sentimento...pois, por este sentimento, lutaremos até ao extremo para defender nosso Brasil ! Liberdade ainda que tardia !”
                                                                                              Rabiscado em França, em 09/05/15                                                                                         Terminado em Macapá, em 28/04/16

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Olá! Boa tarde aqui na França. Bom dia aí no Brasil.
Depois de tanto tempo sem acessar meu blog até parece que é fácil chegar aqui e pedir desculpas pela ausência. Confesso, não é fácil não. Para mim, a ausência soa como "pouco caso". Pois é! Bateu uma certa vergonha... Mas, àqueles que me lêem: Desculpem a ausência, tá? Espero que não tenham sentido a minha falta. Acho que não sentiram mesmo senão teriam reclamado, rsrs.
Por outro lado, sou uma pessoa que precisa de concentração para escrever: preciso de solidão, entenderam? Sem ninguém por perto, sem barulho de televisão, sem ruídos pessoais egocêntricos. Sem fantasmas alheios (pois já bastam os meus).
Como podem ver já está saindo alguma coisa aqui. Mas, estou falando de mim? Não é isto que pretendo. Não quero ser, eu mesma, egocêntrica. Tem muito mais coisa importante para se tratar do que meus gostos pessoais.
Por exemplo, a carta de Mark Manson : "Uma carta aberta ao Brasil". Publico abaixo pois vi que ele retratou com conhecimento de causa o comportamento de nosso povo. E que precisamos todos mudar os pensamentos que se assemelham a essa cultura perniciosa que nos faz termos o comportamento "de querer nos dar bem". Leia sem defesas e sem bairrismo.

Querido Brasil,
O Carnaval acabou. O “ano novo” finalmente vai começar e eu estou te deixando para voltar para o meu país.
Assim como vários outros gringos, eu também vim para cá pela primeira vez em busca de festas, lindas praias e garotas. O que eu não poderia imaginar é que eu passaria a maior parte dos 4 últimos anos dentro das suas fronteiras. Aprenderia muito sobre a sua cultura, sua língua, seus costumes e que, no final deste ano, eu me casaria com uma de suas garotas.
Não é segredo para ninguém que você está passando por alguns problemas. Existe uma crise política, econômica, problemas constantes em relação à segurança, uma enorme desigualdade social e agora, com uma possível epidemia do Zika vírus, uma crise ainda maior na saúde.
Durante esse tempo em que estive aqui, eu conheci muitos brasileiros que me perguntavam: “Por que? Por que o Brasil é tão ferrado? Por que os países na Europa e América do Norte são prósperos e seguros enquanto o Brasil continua nesses altos e baixos entre crises década sim, década não?”
No passado, eu tinha muitas teorias sobre o sistema de governo, sobre o colonialismo, políticas econômicas, etc. Mas recentemente eu cheguei a uma conclusão. Muita gente provavelmente vai achar essa minha conclusão meio ofensiva, mas depois de trocar várias ideias com alguns dos meus amigos, eles me encorajaram a dividir o que eu acho com todos os outros brasileiros.
Então aí vai: é você.
Você é o problema.
Sim, você mesmo que está lendo esse texto. Você é parte do problema. Eu tenho certeza de não é proposital, mas você não só é parte, como está perpetuando o problema todos os dias.
Não é só culpa da Dilma ou do PT. Não é só culpa dos bancos, da iniciativa privada, do escândalo da Petrobras, do aumento do dólar ou da desvalorização do Real.
O problema é a cultura. São as crenças e a mentalidade que fazem parte da fundação do país e são responsáveis pela forma com que os brasileiros escolhem viver as suas vidas e construir uma sociedade.
O problema é tudo aquilo que você e todo mundo a sua volta decidiu aceitar como parte de “ser brasileiro” mesmo que isso não esteja certo.
Quer um exemplo?
Imagine que você está de carona no carro de um amigo tarde da noite. Vocês passam por uma rua escura e totalmente vazia. O papo está bom e ele não está prestando muita atenção quando, de repente, ele arranca o retrovisor de um carro super caro. Antes que alguém veja, ele acelera e vai embora.
No dia seguinte, você ouve um colega de trabalho que você mal conhece dizendo que deixou o carro estacionado na rua na noite anterior e ele amanheceu sem o retrovisor. Pela descrição, você descobre que é o mesmo carro que seu brother bateu “sem querer”. O que você faz?
A) Fica quieto e finge que não sabe de nada para proteger seu amigo? Ou
B) Diz para o cara que sente muito e força o seu amigo a assumir a responsabilidade pelo erro?
Eu acredito que a maioria dos brasileiros escolheria a alternativa A. Eu também acredito que a maioria dos gringos escolheria a alternativa B.
Nos países mais desenvolvidos o senso de justiça e responsabilidade é mais importante do que qualquer indivíduo. Há uma consciência social onde o todo é mais importante do que o bem-estar de um só. E por ser um dos principais pilares de uma sociedade que funciona, ignorar isso é uma forma de egoísmo.
Eu percebo que vocês brasileiros são solidários, se sacrificam e fazem de tudo por suas famílias e amigos mais próximos e, por isso, não se consideram egoístas.
Mas, infelizmente, eu também acredito que grande parte dos brasileiros seja extremamente egoísta, já que priorizar a família e os amigos mais próximos em detrimento de outros membros da sociedade é uma forma de egoísmo.
Sabe todos aqueles políticos, empresários, policiais e sindicalistas corruptos? Você já parou para pensar por que eles são corruptos? Eu garanto que quase todos eles justificam suas mentiras e falcatruas dizendo: “Eu faço isso pela minha família”. Eles querem dar uma vida melhor para seus parentes, querem que seus filhos estudem em escolas melhores e querem viver com mais segurança.
É curioso ver que quando um brasileiro prejudica outro cidadão para beneficiar sua famílias, ele se acha altruísta. Ele não percebe que altruísmo é abrir mão dos próprios interesses para beneficiar um estranho se for para o bem da sociedade como um todo.
Além disso, seu povo também é muito vaidoso, Brasil. Eu fiquei surpreso quando descobri que dizer que alguém é vaidoso por aqui não é considerado um insulto como é nos Estados Unidos. Esta é uma outra característica particular da sua cultura.
Algumas semanas atrás, eu e minha noiva viajamos para um famoso vilarejo no nordeste. Chegando lá, as praias não eram bonitas como imaginávamos e ainda estavam sujas. Um dos pontos turísticos mais famosos era uma pedra que de perto não tinha nada demais. Foi decepcionante.
Quando contamos para as pessoas sobre a nossa percepção, algumas delas imediatamente disseram: “Ah, pelo menos você pode ver e tirar algumas fotos nos pontos turísticos, né?”
Parece uma frase inocente, mas ela ilustra bem essa questão da vaidade: as pessoas por aqui estão muito mais preocupadas com as aparências do que com quem eles realmente são.
É claro que aqui não é o único lugar no mundo onde isso acontece, mas é muito mais comum do que em qualquer outro país onde eu já estive.
Isso explica porque os brasileiros ricos não se importam em pagar três vezes mais por uma roupa de grife ou uma jóia do que deveriam, ou contratam empregadas e babás para fazerem um trabalho que poderia ser feito por eles. É uma forma de se sentirem especiais e parecerem mais ricos. Também é por isso que brasileiros pagam tudo parcelado. Porque eles querem sentir e mostrar que eles podem ter aquela super TV mesmo quando, na realidade, eles não tenham dinheiro para pagar. No fim das contas, esse é o motivo pelo qual um brasileiro que nasceu pobre e sem oportunidades está disposto a matar por causa de uma motocicleta ou sequestrar alguém por algumas centenas de Reais. Eles também querem parecer bem sucedidos, mesmo que não contribuam com a sociedade para merecer isso.
Muitos gringos acham os brasileiros preguiçosos. Eu não concordo. Pelo contrário, os brasileiros tem mais energia do que muita gente em outros lugares do mundo (vide: Carnaval).
O problema é que muitos focam grande parte da sua energia em vaidade em vez de produtividade. A sensação que se tem é que é mais importante parecer popular ou glamouroso do que fazer algo relevante que traga isso como consequência. É mais importante parecer bem sucedido do que ser bem sucedido de fato.
Vaidade não traz felicidade. Vaidade é uma versão “photoshopada” da felicidade. Parece legal vista de fora, mas não é real e definitivamente não dura muito.
Se você precisa pagar por algo muito mais caro do que deveria custar para se sentir especial, então você não é especial. Se você precisa da aprovação de outras pessoas para se sentir importante, então você não é importante. Se você precisa mentir, puxar o tapete ou trair alguém para se sentir bem sucedido, então você não é bem sucedido. Pode acreditar, os atalhos não funcionam aqui.
E sabe o que é pior? Essa vaidade faz com que seu povo evite bater de frente com os outros. Todo mundo quer ser legal com todo mundo e acaba ou ferrando o outro pelas costas, ou indiretamente só para não gerar confronto.
Por aqui, se alguém está 1h atrasado, todo mundo fica esperando essa pessoa chegar para sair. Se alguém decide ir embora e não esperar, é visto como cuzão. Se alguém na família é irresponsável e fica cheio de dívidas, é meio que esperado que outros membros da família com mais dinheiro ajudem a pessoa a se recuperar. Se alguém num grupo de amigos não quer fazer uma coisa específica, é esperado que todo mundo mude os planos para não deixar esse amigo chateado. Se em uma viagem em grupo alguém decide fazer algo sozinho, este é considerado egoísta.
É sempre mais fácil não confrontar e ser boa praça. Só que onde não existe confronto, não existe progresso.
Como um gringo que geralmente não liga a mínima sobre o que as pessoas pensam de mim, eu acho muito difícil não enxergar tudo isso como uma forma de desrespeito e auto-sabotagem. Em diversas circunstâncias eu acabo assistindo os brasileiros recompensarem as “vítimas” e punirem àqueles que são independentes e bem resolvidos.
Por um lado, quando você recompensa uma pessoa que falhou ou está fazendo algo errado, você está dando a ela um incentivo para nunca precisar melhorar. Na verdade, você faz com que ela fique sempre contando com a boa vontade de alguém em vez de ensina-la a ser responsável.
Por outro lado, quando você pune alguém por ser bem resolvido, você desencoraja pessoas talentosas que poderiam criar o progresso e a inovação que esse país tanto precisa. Você impede que o país saia dessa merda que está e cria ainda mais espaço para líderes medíocres e manipuladores se prolongarem no poder.
E assim, você cria uma sociedade que acredita que o único jeito de se dar bem é traindo, mentindo, sendo corrupto, ou nos piores casos, tirando a vida do outro.
As vezes, a melhor coisa que você pode fazer por um amigo que está sempre atrasado é ir embora sem ele. Isso vai fazer com que ele aprenda a gerenciar o próprio tempo e respeitar o tempo dos outros.
Outras vezes, a melhor coisa que você pode fazer com alguém que gastou mais do que devia e se enfiou em dívidas é deixar que ele fique desesperado por um tempo. Esse é o único jeito que fará com que ele aprenda a ser mais responsável com dinheiro no futuro.
Eu não quero parecer o gringo que sabe tudo, até porque eu não sei. E deus bem sabe o quanto o meu país também está na merda (eu já escrevi aqui sobre o que eu acho dos EUA).
Só que em breve, Brasil, você será parte da minha vida para sempre. Você será parte da minha família. Você será meu amigo. Você será metade do meu filho quando eu tiver um.
E é por isso que eu sinto que preciso dividir isso com você de forma aberta, honesta, com o amor que só um amigo pode falar francamente com outro, mesmo quando sabemos que o que temos a dizer vai doer.
E também porque eu tenho uma má notícia: não vai melhorar tão cedo.
Talvez você já saiba disso, mas se não sabe, eu vou ser aquele que vai te dizer: as coisas não vão melhorar nessa década.
O seu governo não vai conseguir pagar todas as dívidas que ele fez a não ser que mude toda a sua constituição. Os grandes negócios do país pegaram dinheiro demais emprestado quando o dólar estava baixo, lá em 2008-2010 e agora não vão conseguir pagar já que as dívidas dobraram de tamanho. Muitos vão falir por causa disso nos próximos anos e isso vai piorar a crise.
O preço das commodities estão extremamente baixos e não apresentam nenhum sinal de aumento num futuro próximo, isso significa menos dinheiro entrando no país. Sua população não é do tipo que poupa e sim, que se endivida. As taxas de desemprego estão aumentando, assim como os impostos que estrangulam a produtividade da classe trabalhadora.
Você está ferrado. Você pode tirar a Dilma de lá, ou todo o PT. Pode (e deveria) refazer a constituição, mas não vai adiantar. Os erros já foram cometidos anos atrás e agora você vai ter que viver com isso por um tempo.
Se prepare para, no mínimo, 5-10 anos de oportunidades perdidas. Se você é um jovem brasileiro, muito do que você cresceu esperando que fosse conquistar, não vai mais estar disponível. Se você é um adulto nos seus 30 ou 40, os melhores anos da economia já fazem parte do seu passado. Se você tem mais de 50, bem, você já viu esse filme antes, não viu?
É a mesma velha história, só muda a década. A democracia não resolveu o problema. Uma moeda forte não resolveu o problema. Tirar milhares de pessoa da pobreza não resolveu o problema. O problema persiste. E persiste porque ele está na mentalidade das pessoas.
O “jeitinho brasileiro” precisa morrer. Essa vaidade, essa mania de dizer que o Brasil sempre foi assim e não tem mais jeito também precisa morrer. E a única forma de acabar com tudo isso é se cada brasileiro decidir matar isso dentro de si mesmo.
Ao contrario de outras revoluções externas que fazem parte da sua história, essa revolução precisa ser interna. Ela precisa ser resultado de uma vontade que invade o seu coração e sua alma.
Você precisa escolher ver as coisas de um jeito novo. Você precisa definir novos padrões e expectativas para você e para os outros. Você precisa exigir que seu tempo seja respeitado. Você deve esperar das pessoas que te cercam que elas sejam responsabilizadas pelas suas ações. Você precisa priorizar uma sociedade forte e segura acima de todo e qualquer interesse pessoal ou da sua família e amigos. Você precisa deixar que cada um lide com os seus próprios problemas, assim como você não deve esperar que ninguém seja obrigado a lidar com os seus.
Essas são escolhas que precisam ser feitas diariamente. Até que essa revolução interna aconteça, eu temo que seu destino seja repetir os mesmos erros por muitas outras gerações que estão por vir.
Você tem uma alegria que é rara e especial, Brasil. Foi isso que me atraiu em você muitos anos atrás e que me faz sempre voltar. Eu só espero que um dia essa alegria tenha a sociedade que merece.
Seu amigo,
Mark
Traduzido por Fernanda Neute




Uma coisa que adoro.

Uma coisa que adoro.
No inverno, fica tudo assim. Foto:D.B.

Os lagos

Os lagos
Pegamos nossos remos e varejões e saímos com muito cuidado para não triscar nos jacarés e sucuris. Foto: Veneide