Olá! Boa tarde aqui na França. Bom dia aí no Brasil.
Depois de tanto tempo sem acessar meu blog até parece que é fácil chegar aqui e pedir desculpas pela ausência. Confesso, não é fácil não. Para mim, a ausência soa como "pouco caso". Pois é! Bateu uma certa vergonha... Mas, àqueles que me lêem: Desculpem a ausência, tá? Espero que não tenham sentido a minha falta. Acho que não sentiram mesmo senão teriam reclamado, rsrs.
Por outro lado, sou uma pessoa que precisa de concentração para escrever: preciso de solidão, entenderam? Sem ninguém por perto, sem barulho de televisão, sem ruídos pessoais egocêntricos. Sem fantasmas alheios (pois já bastam os meus).
Como podem ver já está saindo alguma coisa aqui. Mas, estou falando de mim? Não é isto que pretendo. Não quero ser, eu mesma, egocêntrica. Tem muito mais coisa importante para se tratar do que meus gostos pessoais.
Por exemplo, a carta de Mark Manson : "Uma carta aberta ao Brasil". Publico abaixo pois vi que ele retratou com conhecimento de causa o comportamento de nosso povo. E que precisamos todos mudar os pensamentos que se assemelham a essa cultura perniciosa que nos faz termos o comportamento "de querer nos dar bem". Leia sem defesas e sem bairrismo.
Querido
Brasil,
O
Carnaval acabou. O “ano novo” finalmente vai começar e eu estou te deixando
para voltar para o meu país.
Assim
como vários outros gringos, eu também vim para cá pela primeira vez em busca de
festas, lindas praias e garotas. O que eu não poderia imaginar é que eu
passaria a maior parte dos 4 últimos anos dentro das suas fronteiras.
Aprenderia muito sobre a sua cultura, sua língua, seus costumes e que, no final
deste ano, eu me casaria com uma de suas garotas.
Não é
segredo para ninguém que você está passando por alguns problemas. Existe uma
crise política, econômica, problemas constantes em relação à segurança, uma
enorme desigualdade social e agora, com uma possível epidemia do Zika vírus,
uma crise ainda maior na saúde.
Durante
esse tempo em que estive aqui, eu conheci muitos brasileiros que me
perguntavam: “Por que? Por que o Brasil é tão ferrado? Por que os países na
Europa e América do Norte são prósperos e seguros enquanto o Brasil continua
nesses altos e baixos entre crises década sim, década não?”
No
passado, eu tinha muitas teorias sobre o sistema de governo, sobre o
colonialismo, políticas econômicas, etc. Mas recentemente eu cheguei a uma
conclusão. Muita gente provavelmente vai achar essa minha conclusão meio
ofensiva, mas depois de trocar várias ideias com alguns dos meus amigos, eles
me encorajaram a dividir o que eu acho com todos os outros brasileiros.
Então
aí vai: é você.
Você é
o problema.
Sim,
você mesmo que está lendo esse texto. Você é parte do problema. Eu tenho
certeza de não é proposital, mas você não só é parte, como está perpetuando o
problema todos os dias.
Não é
só culpa da Dilma ou do PT. Não é só culpa dos bancos, da iniciativa privada,
do escândalo da Petrobras, do aumento do dólar ou da desvalorização do Real.
O
problema é a cultura. São as crenças e a mentalidade que fazem parte da
fundação do país e são responsáveis pela forma com que os brasileiros escolhem
viver as suas vidas e construir uma sociedade.
O
problema é tudo aquilo que você e todo mundo a sua volta decidiu aceitar como
parte de “ser brasileiro” mesmo que isso não esteja certo.
Quer um
exemplo?
Imagine
que você está de carona no carro de um amigo tarde da noite. Vocês passam por
uma rua escura e totalmente vazia. O papo está bom e ele não está prestando
muita atenção quando, de repente, ele arranca o retrovisor de um carro super
caro. Antes que alguém veja, ele acelera e vai embora.
No dia
seguinte, você ouve um colega de trabalho que você mal conhece dizendo que
deixou o carro estacionado na rua na noite anterior e ele amanheceu sem o
retrovisor. Pela descrição, você descobre que é o mesmo carro que seu brother
bateu “sem querer”. O que você faz?
A) Fica
quieto e finge que não sabe de nada para proteger seu amigo? Ou
B) Diz para o cara que sente muito e força o seu amigo a assumir a
responsabilidade pelo erro?
Eu
acredito que a maioria dos brasileiros escolheria a alternativa A. Eu também
acredito que a maioria dos gringos escolheria a alternativa B.
Nos
países mais desenvolvidos o senso de justiça e responsabilidade é mais
importante do que qualquer indivíduo. Há uma consciência social onde o todo é
mais importante do que o bem-estar de um só. E por ser um dos principais
pilares de uma sociedade que funciona, ignorar isso é uma forma de egoísmo.
Eu
percebo que vocês brasileiros são solidários, se sacrificam e fazem de tudo por
suas famílias e amigos mais próximos e, por isso, não se consideram egoístas.
Mas,
infelizmente, eu também acredito que grande parte dos brasileiros seja
extremamente egoísta, já que priorizar a família e os amigos mais próximos em
detrimento de outros membros da sociedade é uma forma de egoísmo.
Sabe
todos aqueles políticos, empresários, policiais e sindicalistas corruptos? Você
já parou para pensar por que eles são corruptos? Eu garanto que quase todos
eles justificam suas mentiras e falcatruas dizendo: “Eu faço isso pela minha
família”. Eles querem dar uma vida melhor para seus parentes, querem que seus
filhos estudem em escolas melhores e querem viver com mais segurança.
É
curioso ver que quando um brasileiro prejudica outro cidadão para beneficiar
sua famílias, ele se acha altruísta. Ele não percebe que altruísmo é abrir mão
dos próprios interesses para beneficiar um estranho se for para o bem da
sociedade como um todo.
Além
disso, seu povo também é muito vaidoso, Brasil. Eu fiquei surpreso quando
descobri que dizer que alguém é vaidoso por aqui não é considerado um insulto
como é nos Estados Unidos. Esta é uma outra característica particular da sua
cultura.
Algumas
semanas atrás, eu e minha noiva viajamos para um famoso vilarejo no nordeste.
Chegando lá, as praias não eram bonitas como imaginávamos e ainda estavam
sujas. Um dos pontos turísticos mais famosos era uma pedra que de perto não
tinha nada demais. Foi decepcionante.
Quando
contamos para as pessoas sobre a nossa percepção, algumas delas imediatamente
disseram: “Ah, pelo menos você pode ver e tirar algumas fotos nos pontos
turísticos, né?”
Parece
uma frase inocente, mas ela ilustra bem essa questão da vaidade: as pessoas por
aqui estão muito mais preocupadas com as aparências do que com quem eles
realmente são.
É claro
que aqui não é o único lugar no mundo onde isso acontece, mas é muito mais
comum do que em qualquer outro país onde eu já estive.
Isso
explica porque os brasileiros ricos não se importam em pagar três vezes mais
por uma roupa de grife ou uma jóia do que deveriam, ou contratam empregadas e
babás para fazerem um trabalho que poderia ser feito por eles. É uma forma de
se sentirem especiais e parecerem mais ricos. Também é por isso que brasileiros
pagam tudo parcelado. Porque eles querem sentir e mostrar que eles podem ter
aquela super TV mesmo quando, na realidade, eles não tenham dinheiro para
pagar. No fim das contas, esse é o motivo pelo qual um brasileiro que nasceu
pobre e sem oportunidades está disposto a matar por causa de uma motocicleta ou
sequestrar alguém por algumas centenas de Reais. Eles também querem parecer bem
sucedidos, mesmo que não contribuam com a sociedade para merecer isso.
Muitos
gringos acham os brasileiros preguiçosos. Eu não concordo. Pelo contrário, os
brasileiros tem mais energia do que muita gente em outros lugares do mundo
(vide: Carnaval).
O
problema é que muitos focam grande parte da sua energia em vaidade em vez de
produtividade. A sensação que se tem é que é mais importante parecer popular ou
glamouroso do que fazer algo relevante que traga isso como consequência. É mais
importante parecer bem sucedido do que ser bem sucedido de fato.
Vaidade
não traz felicidade. Vaidade é uma versão “photoshopada” da felicidade. Parece
legal vista de fora, mas não é real e definitivamente não dura muito.
Se você
precisa pagar por algo muito mais caro do que deveria custar para se sentir
especial, então você não é especial. Se você precisa da aprovação de outras
pessoas para se sentir importante, então você não é importante. Se você precisa
mentir, puxar o tapete ou trair alguém para se sentir bem sucedido, então você
não é bem sucedido. Pode acreditar, os atalhos não funcionam aqui.
E sabe
o que é pior? Essa vaidade faz com que seu povo evite bater de frente com os
outros. Todo mundo quer ser legal com todo mundo e acaba ou ferrando o outro
pelas costas, ou indiretamente só para não gerar confronto.
Por
aqui, se alguém está 1h atrasado, todo mundo fica esperando essa pessoa chegar
para sair. Se alguém decide ir embora e não esperar, é visto como cuzão. Se
alguém na família é irresponsável e fica cheio de dívidas, é meio que esperado
que outros membros da família com mais dinheiro ajudem a pessoa a se recuperar.
Se alguém num grupo de amigos não quer fazer uma coisa específica, é esperado
que todo mundo mude os planos para não deixar esse amigo chateado. Se em uma
viagem em grupo alguém decide fazer algo sozinho, este é considerado egoísta.
É
sempre mais fácil não confrontar e ser boa praça. Só que onde não existe
confronto, não existe progresso.
Como um
gringo que geralmente não liga a mínima sobre o que as pessoas pensam de mim,
eu acho muito difícil não enxergar tudo isso como uma forma de desrespeito e
auto-sabotagem. Em diversas circunstâncias eu acabo assistindo os brasileiros
recompensarem as “vítimas” e punirem àqueles que são independentes e bem
resolvidos.
Por um
lado, quando você recompensa uma pessoa que falhou ou está fazendo algo errado,
você está dando a ela um incentivo para nunca precisar melhorar. Na verdade,
você faz com que ela fique sempre contando com a boa vontade de alguém em vez
de ensina-la a ser responsável.
Por
outro lado, quando você pune alguém por ser bem resolvido, você desencoraja
pessoas talentosas que poderiam criar o progresso e a inovação que esse país
tanto precisa. Você impede que o país saia dessa merda que está e cria ainda
mais espaço para líderes medíocres e manipuladores se prolongarem no poder.
E
assim, você cria uma sociedade que acredita que o único jeito de se dar bem é
traindo, mentindo, sendo corrupto, ou nos piores casos, tirando a vida do
outro.
As
vezes, a melhor coisa que você pode fazer por um amigo que está sempre atrasado
é ir embora sem ele. Isso vai fazer com que ele aprenda a gerenciar o próprio
tempo e respeitar o tempo dos outros.
Outras
vezes, a melhor coisa que você pode fazer com alguém que gastou mais do que
devia e se enfiou em dívidas é deixar que ele fique desesperado por um tempo.
Esse é o único jeito que fará com que ele aprenda a ser mais responsável com
dinheiro no futuro.
Só que
em breve, Brasil, você será parte da minha vida para sempre. Você será parte da
minha família. Você será meu amigo. Você será metade do meu filho quando eu tiver
um.
E é por
isso que eu sinto que preciso dividir isso com você de forma aberta, honesta,
com o amor que só um amigo pode falar francamente com outro, mesmo quando
sabemos que o que temos a dizer vai doer.
E
também porque eu tenho uma má notícia: não vai melhorar tão cedo.
Talvez
você já saiba disso, mas se não sabe, eu vou ser aquele que vai te dizer: as
coisas não vão melhorar nessa década.
O seu
governo não vai conseguir pagar todas as dívidas que ele fez a não ser que mude
toda a sua constituição. Os grandes negócios do país pegaram dinheiro demais
emprestado quando o dólar estava baixo, lá em 2008-2010 e agora não vão
conseguir pagar já que as dívidas dobraram de tamanho. Muitos vão falir por
causa disso nos próximos anos e isso vai piorar a crise.
O preço
das commodities estão extremamente baixos e não apresentam nenhum sinal de
aumento num futuro próximo, isso significa menos dinheiro entrando no país. Sua
população não é do tipo que poupa e sim, que se endivida. As taxas de
desemprego estão aumentando, assim como os impostos que estrangulam a
produtividade da classe trabalhadora.
Você
está ferrado. Você pode tirar a Dilma de lá, ou todo o PT. Pode (e deveria)
refazer a constituição, mas não vai adiantar. Os erros já foram cometidos anos
atrás e agora você vai ter que viver com isso por um tempo.
Se
prepare para, no mínimo, 5-10 anos de oportunidades perdidas. Se você é um
jovem brasileiro, muito do que você cresceu esperando que fosse conquistar, não
vai mais estar disponível. Se você é um adulto nos seus 30 ou 40, os melhores
anos da economia já fazem parte do seu passado. Se você tem mais de 50, bem,
você já viu esse filme antes, não viu?
É a
mesma velha história, só muda a década. A democracia não resolveu o problema.
Uma moeda forte não resolveu o problema. Tirar milhares de pessoa da pobreza
não resolveu o problema. O problema persiste. E persiste porque ele está na
mentalidade das pessoas.
O
“jeitinho brasileiro” precisa morrer. Essa vaidade, essa mania de dizer que o
Brasil sempre foi assim e não tem mais jeito também precisa morrer. E a única
forma de acabar com tudo isso é se cada brasileiro decidir matar isso dentro de
si mesmo.
Ao
contrario de outras revoluções externas que fazem parte da sua história, essa
revolução precisa ser interna. Ela precisa ser resultado de uma vontade que
invade o seu coração e sua alma.
Você
precisa escolher ver as coisas de um jeito novo. Você precisa definir novos
padrões e expectativas para você e para os outros. Você precisa exigir que seu
tempo seja respeitado. Você deve esperar das pessoas que te cercam que elas
sejam responsabilizadas pelas suas ações. Você precisa priorizar uma sociedade
forte e segura acima de todo e qualquer interesse pessoal ou da sua família e
amigos. Você precisa deixar que cada um lide com os seus próprios problemas,
assim como você não deve esperar que ninguém seja obrigado a lidar com os seus.
Essas
são escolhas que precisam ser feitas diariamente. Até que essa revolução
interna aconteça, eu temo que seu destino seja repetir os mesmos erros por
muitas outras gerações que estão por vir.
Você
tem uma alegria que é rara e especial, Brasil. Foi isso que me atraiu em você
muitos anos atrás e que me faz sempre voltar. Eu só espero que um dia essa
alegria tenha a sociedade que merece.
Seu
amigo,
Mark
Traduzido
por Fernanda Neute