quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

A inquilina insólita.

Publicado no Diariodoamapa.com.br em 21.01.2014

Descobri que tenho uma inquilina clandestina quando eu trabalhava um dia qualquer na área de serviço. Levei um susto com a surpresa. A bicha deu um salto e desapareceu no quintal fazendo-me crer que dava adeus para nunca mais voltar. No 1º dia do ano, ao abrir o armário situado sob o tanque de lavar roupas, eu a vi, ali, a me encarar impondo sua presença. Cruzamos novamente os olhares e percebi que aquela criatura havia adotado a minha casa para passar as festas de fim de ano, e estava ficando...estava ficando... Quando tentei juntar a garrafa seca que havia virado, a criatura deu um salto e saiu, pulando para baixo da máquina de lavar roupas. Sem contar que me deixava boquiaberta com tanta destreza em se desembaraçar de minha presença. Cogitei comigo mesma que, a causa de sua mudança para a minha casa só poderia ter duas explicações: ou a criatura habita o poço amazonas que existe no quintal e teria sido inquietada quando mandamos limpá-lo para substituir o bocal por uma tampa reforçada a nível do piso para podermos circular livremente, ou a dita criatura teria vindo entre as nossas coisas de seu habitat natural, na fazenda.
O certo é que, uma perereca sozinha não faz verão.
Então, não se justifica a sua presença solitária no inicio de 2014, dentro de um poço na cidade afastado de áreas de ressaca! Já vai longe o tempo em que convivíamos no centro de Macapá com sapos e cobras. Lembro que, no final dos anos 60, ainda tomávamos banho com sapos dentro do banheiro de madeira da casa de meus pais. Concluí que, sem perceber, trouxemos a pobrezinha na nossa bagagem da beira do rio. Só vejo esta explicação. E agora? Posso esperar encontrar uma cobra também? A lembrança da cadeia alimentar me impõe este receio.

O que fazer então com a perereca? Tentar aprisioná-la e levá-la de volta para a beira do rio, ou tentar combatê-la? Mas, e se ela pertencer àquela espécie de sapos extremamente fatais à vida humana? Não vou correr riscos. Ela invadiu meu território, mas, reconheço que, antes, eu invadi o dela. E agora? Ressuscito a extinta Inquisição? Chamo a polícia? Ou chamo o corpo de bombeiros? Não sou do tipo que tem medo de perereca, nem vou ocupar o aparelho estadual com uma criatura tão inofensiva. Ora, bolas! Sou filha de um ex-caçador. Só espero que ela não atraia a cobra que já deve estar na casa do vizinho. Afinal, talvez eu tenha provocado esta situação. Mas, já bastam as “cobras” que existem no estado. Então: Chô perereca, chô cobra... Mesmo sabendo que a pererequinha pode ser útil para combater mosquitos espero que procure outro endereço. Adianto que não vou cobrar aluguel.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

A necessidade do ser humano de produzir ídolos

Publicado no Diariodoamapa.com.br  em 15.02.2014

 
Produzir ídolos é uma tendência inerente ao ser humano.
Quando crianças, selecionamos nossos ídolos entre os que fazem parte de nosso círculo familiar e entre os heróis de desenho animado ou de algum filme.
Qual o garoto ou garota não fica de boca aberta e olhos vidrados na imagem do Chaves, do Batman, do He-Man, do Tio Patinhas, do Shrek, da Pucca e de outros heróis ou heroínas que embalam os sonhos de cada geração?
Quando começamos a receber as informações religiosas em casa ou na escola, o objeto de nosso culto, o nosso ídolo, será aquele que nossos pais cultuam ou que a professora de religião acha que é bom para nós ou, ainda, aquele que a igreja que nossos pais frequentam já escolheu por nós. Há quem pense que a religião ajuda a educar para incutir bons sentimentos, bons comportamentos, o que é válido quando não se tem o bom exemplo em casa. E, infelizmente, muitas crianças não têm esse bom exemplo pois é a educação recebida no seio familiar que imprime os primeiros traços no caráter.
Já adultos, mesmo que ainda admiremos Batman, Tio Patinhas, etc, temos conhecimento suficiente em outras áreas para expandir nosso círculo de ídolos. No esporte não será diferente. Talvez o futebol comercial, aquele que envolve muito dinheiro, não deva mais ser incluído entre os esportes porque esta categoria de futebol faz é tempo que deixou de ser esporte para ser um “negócio da China”. Mas, vamos lá. Esporte ou negócio, o futebol é cheio de ídolos que se sucedem com uma rapidez incrível.
Na política, nem se fala! Ídolo é o que mais se produz. Basta alguém receber um presente ou ouvir uma falsa promessa de algum político para idolatrá-lo e transformá-lo no “Cara”, no seu ídolo, no homem ou mulher a ser perpetuado no poder. Quantos líderes religiosos ou políticos chegaram ao poder com um patrimônio modesto e, hoje, possuem verdadeiros impérios montados em cima da manipulação das pessoas? Quanta desgraça a idolatria causou na vida das pessoas! Hitler, Mussolini, Stalin, Mao, Kim Jong-il e outros tornaram-se ditadores porque, antes do temor e do terror que causaram foram idolatrados. Empurrados para o poder graças à crise econômica e social interna nos seus países.
Vamos sair da inércia e incentivar o que é bom em vez de continuar a prestar culto a ídolos corruptos e corruptores da dignidade: Qual é o alimento que fortalece a mente e abre os espíritos? A leitura. Quantas bibliotecas públicas já foram criadas aqui no Amapá (antigo Território e atual Estado) ao longo de sua existência? Quantas vagas de Bibliotecário (nível superior), professores de música e professores de arte são ofertadas em concursos públicos? O que é que proporciona ao ser humano o amplo exercício da cidadania? O conhecimento. O que é que desvia o adolescente da marginalidade? Leis e investimentos que disponibilizem meios para que a criança e o jovem descarreguem suas energias no esporte em geral (não apenas futebol!) e descubram as delícias que o aprendizado da música instrumental e as artes proporcionam à alma. Investir no grande potencial de nossa infância e juventude representa, entre outros, uma vida melhor para todos; a diminuição da miséria humana e da insegurança dos cidadãos; a diminuição da clientela carcerária. Mas, nem por isso se deve abrir mão do policiamento ostensivo.

Afinal, aqueles que se apossam do erário público roubam a vida, a segurança e a harmonia das famílias que se formam para dar o melhor para seus membros. Pois que as viúvas e os órfãos da violência, os pais e irmãos das vítimas do descaso amaldiçoem todos aqueles que construíram suas riquezas sobre o choro da miséria deste povo. E que seus filhos joguem isso nas suas caras e a velhice de suas cabeças não descanse em paz no travesseiro.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O espetáculo da vida no rio.

Publicado no Diariodoamapa.com.br em 18.01.2014 As fotos sao minhas.

Foto: Veneide Cherfen

Foto: Veneide Cherfen
Foto: Veneide Cherfen. O peao andarilho.

Foto: Veneide Cherfen
Eu e a canoa.

Sete horas desta manhã de janeiro chuvoso. 25° na beira do rio. No Norte do Brasil, onde a temperatura atinge acima de 30°, uma baixa de 5° faz tirar a roupa mais quente do armário. Tudo tranqüilo na cabeça da ponte. As touças de mururé descem o rio com a vazante para voltarem depois, com a enchente. O boto atrai a atenção com sua magia e beleza fazendo seus mergulhos habituais de pesca. É o terror do pescador quando fura as malhadeiras para atacar os peixes indefesos fazendo-lhes buracos enormes causando duplo prejuízo: um, porque come o alimento que o pescador deveria levar para casa, outro, porque danifica o seu instrumento de sustento. Para as virgens dos vários recantos escondidos da Amazônia, o boto ainda é a desculpa utilizada quando dão com os burros n`água ou, quando desgraçadas pela animália existente em algum próximo, até mesmo da própria família, a barriga começa a crescer. É quando ele se transforma naquele belo homem de olhos azuis vestido de branco e de chapéu na cabeça, que entra nas casas como quem não quer nada, vindo não se sabe de onde mas que, na verdade, vem namorar e engravidar as moças das redondezas. Dizem ainda que, quando ele vai embora deixa um cheiro de pitiú no ambiente e desaparece no ar, ou melhor, na água, sem ser identificado. Só então desconfiam que o intruso era um boto. Aí, é um Deus nos acuda...A boa Maria, que vem de Macapá mas que nasceu e embarrigou a primeira vez na Ilha de Caviana, quando dorme na fazenda fecha todas as venezianas e coloca dentes de alho no sutiã, com medo do boto. Para que a noite se alongue, basta pedir-lhe que conte uma história de boto. Ela solta a língua e repete as lendas de sua terra natal. Entre elas, a história de que uma “buta” deitou-se na rede com o irmão dela e quase o encantou. Os rapazes adoram atiçar a Maria e, no final, todos acabam rindo. Durante o dia, quando a maré sobe, traz consigo os restos de um animal morto que os urubus tentam devorar por cima. Os mururés continuam na sua labuta diária de subir e descer o rio, de acordo com a corrente, sem remar e sem precisar de outro meio de transporte para se locomover a não ser a própria correnteza. No entanto, sabe-se lá que espécies de criaturas levam consigo. Quase se escuta a música silenciosa composta por suas pesadas raízes no atrito das profundezas das águas. O silêncio só é cortado pela canoa que, ao bater na madeira da lancha faz um barulho baixo e ritmado e por um grupo de tetéuas barulhentas que bailam por cima da ponte. Verdadeiro espetáculo. Sem necessidade de ir à Ópera de Paris, de Lyon ou de Douai. Aqui, tem de tudo. O italiano Verdi comporia maravilhas com toda esta riqueza.
No fim da tarde, depois de voltar da roça com os últimos jerimuns e maxixes o empregado remplaçant entra com uma enfiada de acaris e apaiaris pescados ao lado da casa numa rara e agradável surpresa. Depois, vai tomar seu banho no rio e repete o cerimonial habitual para seu passeio noturno. Vai fazer concorrência aos mururés, num descer e subir do rio...remando.

A noite chega depois de um dia chuvoso. Do outro lado do rio, os guaribas gritam chamando as fêmeas. Preparam-se para o encontro. A água continua a descer num vai-e-vem interminável. Os mururés se despedem de nossas vistas para se agarrarem ao primeiro local estável que encontram pelo caminho. Quisera eu poder escorregar como eles sobre as águas!

Aos pais liberais.

Publicado no Diariodoamapa.com.br dia 14.01.2014

Trata-se aqui de uma sugestão de campanha educativa para os órgãos competentes. Os pessimistas dirão que é um sonho. Não importa. Tal campanha, teria como objetivo lembrar aos pais (entre os quais me incluo) o seu papel de orientadores dos filhos e, até mesmo, de controladores, alertando sobre os problemas causados pela liberalidade e, atentando para o fato de que: dar liberdade não é o mesmo que ser liberal. Liberdade é o poder de agir, no seio de uma sociedade organizada, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas. Liberal é aquele que tem idéias ou opiniões avançadas, amplas, tolerantes, livres (Dic. Aurélio). Imprescindível ter cuidado em não cometer exageros na investidura dos adjetivos tolerantes e livres, na educação dos filhos.
Não existe um manual que ensine como criar bem os filhos. Então, que tal relembrar aquelas velhas frases e regras ensinadas na infância e na adolescência de gerações passadas: “Diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és; Achou, não é teu, e se achou no quintal do vizinho, pertence ao vizinho; Filho deve dormir em casa e não na casa de colega; Hora certa para chegar em casa; Direção, só depois dos 18 anos, (não apenas por imposição da lei mas, também, porque nesta idade pressupõem-se que o jovem esteja preparado emocional e fisicamente para dirigir um veículo automotor e assumir responsabilidades).” Aos especialistas compete desenvolver o tema.
Parece que alguns pais têm medo de ser arcaicos. O papel dos pais não deve ser confundido. Filho não está em condições de exigir bens materiais dos pais e nem de impor situações. Os pais têm que saber dosar, orientar, ser firmes. Quando necessário, saber impor. Respeito e educação nunca serão cafonas. Não se deve confundir liberdade com libertinagem (desregramento, licenciosidade) e falta de controle.
A televisão é o canal de comunicação que entra em todos os lares. Do mais abastado ao menos desprovido. Serve de companheira e de ama-seca em muitos casos. Transporta o telespectador para um mundo inimaginável de sonhos e fantasias. E é nefasta quando incontrolada. Pode e deve ser usada para educar os pais.
O brasileiro, em geral, lê pouco. Mas todos assistem novela. Nossa sociedade está apodrecendo, e os motivos principais são a falta de educação, a corrupção e o individualismo. Sem falar na isenção total de alguns pais na educação dos filhos. Muitos pais acham que é obrigação da Escola. Mas não é. Cada um cumpre um papel definido na formação de um Ser. O mau comportamento e a falta de respeito de certos jovens têm causado graves conseqüências às famílias amapaenses. Precisa-se consertar muita coisa. Aos homens e mulheres de boa vontade, mãos à obra...


domingo, 9 de fevereiro de 2014

Aventura.

Publicado no Diariodoamapa.com.br em 08.02.2014


“Mas, essa cobrinha é uma surucucu. O novo empregado que limpava ao redor da casa confirma. Sim, dona. Já era esperado que o substituto fosse embora sem fazer a limpeza de praxe. O mato crescia ao redor e o novo casal acabava de ocupar com os dois filhos a casa na beira do igarapé. O pão assava no forno porque a falta de energia estava uma constante nas residências da orla do rio e não permitia que se usasse a máquina de fazer pão. A primeira preocupação da patroa depois que se apresentou a propriedade ao empregado foi a lavagem e o tratamento da caixa de água. Já era tempo. No momento, os bezerros estão presos no curral e só serão soltos de manhã depois da ordenha das mães. O leite vem a caminho e o queijo não vai demorar. A noite anterior correra tranqüila e repousante nos arredores do Município de Amapá depois de duas longas viagens. Três dias antes um vai e vem turístico ensolarado, carro lotado com familiares, saindo de Macapá direto para o Museu a Céu Aberto da Base Aérea do Amapá para, em seguida, seguir até Cachoeira Grande. Uma noite espetacular e, depois do café da manhã seguinte, saiu-se rumo ao Sitio Arqueológico do Rego Grande, em Calçoene, na direção do Cunani. Conforme planejado, o guardião do Stonehenge Brasileiro já aguardava na cidade para servir de guia mais uma vez. Depois da volta para Macapá no domingo uma noite foi suficiente para recuperar o organismo do cansaço da estrada. O retorno àquela região na segunda-feira à tarde foi necessário para fazer a mudança dos novos empregados que aguardavam depois de quinze dias. Aventuras atrás de aventuras, não sobrou disposição para ir à festa do santo local. O sono chegou pesado. Ficar na pousada para dormir cedo foi a decisão acertada. A viagem na manhã da terça-feira para a propriedade rural situada em outra região atravessando estradas arrebentadas, atoleiros e pontes de madeira exigiria mais repouso. Principalmente porque o carro iria carregado com a família de novos caseiros e seus pertences prontos para substituir o empregado remplaçant e contentes com a perspectiva de um emprego fixo com direito ao leite das crianças e a facilidade dos peixes próximo a casa. Na pousada fora servido um suco de goiaba araçá delicioso no café da manhã. Os caroços da goiaba que nos foi presenteada pela proprietária já estão no vaso esperando grelar e ser transplantados. A popa da fruta se transformou em suco. Uma goiaba apenas rendeu um litro de suco. Vale a pena plantar. Parte da horta que antes era habitada por formigas já se havia limpado e, agora, a caseira continuou a limpeza. Brevemente estará pronta para receber os rebentos de couve, pimentão e cebolinha cujas sementes plantei ontem. Sem esquecer a chicória, a alfavaca, o caruru e a pimentinha. Uma bela horta suspensa. Porém, não se deve ter ilusões quanto aos empregados e nem ter medo de mudar quando necessário. O passado serve como experiência; o futuro é incerto, apesar de ter como termômetro o presente. A imagem do piazinho de seis anos vestido de chinezinho azul (fantasia que usou na escola ano passado), usando um chapéu de tecido leve, correndo sem medo com o padrasto atrás dos cavalos no pasto causa um misto de prazer e de temor. O casal educa bem os filhos. Sandálias e sapatos na porta da casa demonstram o respeito pelo trabalho de quem limpa e evita levar a sujeira para dentro da casa. A garrafa de café ofertada voluntariamente para a visita se servir conforme a sua vontade fora uma demonstração de calorosa recepção e desapego. Na maioria das casas brasileiras de gente abastada, atualmente, é quase raro ser recepcionado com alguma bebida. Na casa do pobre sai sempre um cafezinho. Porém, com café ou sem café, o que importa mesmo é um bom papo."

Uma coisa que adoro.

Uma coisa que adoro.
No inverno, fica tudo assim. Foto:D.B.

Os lagos

Os lagos
Pegamos nossos remos e varejões e saímos com muito cuidado para não triscar nos jacarés e sucuris. Foto: Veneide